Revisão de carreiras marca passo

Propostas do Governo vêm sempre com o cunho de que não podem provocar impacto orçamental, acusam os sindicatos. E não aceitam

Com as greves na Administração Pública (AP) a multiplicarem-se, a revisão das carreiras é um dos temas quentes em cima da mesa e que tem originado muitas das paralisações. “Há carreiras por rever desde 2008”, constata Helena Rodrigues, presidente do Sindicato dos Quadros Técnicos do Estado (STE). Outras “não são revistas há 17 anos”, acrescenta José Abraão, dirigente da Federação Sindical da Administração Pública (FESAP) e membro da comissão política do PS.

Em causa estão, entre outros, os trabalhadores dos Registos e Notariado, da Autoridade Tributária e Aduaneira, fiscais e polícias municipais, bombeiros, carreiras da inspeção externa da Administração Pública (como a inspeção da Segurança Social, ou a inspeção do trabalho), técnicos superiores de diagnóstico e terapêutica, técnicos superiores de saúde, farmacêuticos, enfermeiros, guardas prisionais e oficiais de justiça.

O Governo avançou já para a negociação da revisão de várias carreiras. O problema, dizem os sindicatos, é que as propostas vêm sempre com o cunho de que não podem provocar impacto orçamental. Ora, “como é que se revê uma carreira ao fim de tantos anos sem provocar impacto orçamental?”, interroga José Abraão. Helena Rodrigues aponta no mesmo sentido: “Não provocar impacto orçamental é manter tudo igual. E o que interessa às pessoas não é o nome da carreira, é o que recebem ao fim do mês”. Ana Avoila, coordenadora da Frente Comum dos Sindicatos da Administração Pública, vai mais longe: “Há propostas que até baixam a remuneração média da carreira”.

José Abraão junta outro problema: “O Governo está a propor carreiras unicategoriais, o que os trabalhadores não aceitam, porque têm muito menos perspetivas de evolução”. Isto porque acaba a possibilidade de serem promovidos, mudando de categoria, e apenas podem avançar através de progressões (ver P&R).

Sindicatos insistem em aumentos

Apesar de ser já conhecido que o Governo destinou os €50 milhões previstos no Orçamento do Estado para aumentos na AP no próximo ano para passar a primeira posição remuneratória para os €635 mensais, indo além do aumento do salário mínimo para os €600, os sindicatos não desarmam. Querem aumentos salariais para todos os funcionários públicos. “Em 2019 cumpre-se uma década sem qualquer aumento salarial”, lembra José Abraão, destacando que o ministro das Finanças “tem tentado confundir a opinião pública, misturando valorizações associadas a progressões, a que os trabalhadores tinham direito, alguns há vários anos, com aumentos salariais”. Para Helena Rodrigues “não é justificável uma redução do défice para lá do previsto à custa dos trabalhadores da Administração Pública”.

“Foi-se empurrando os problemas para a frente e agora estão todos a estalar”, diz José Abraão. E remata: “As pessoas pedem-nos que entremos com pré-avisos de greve. Estão dispostas a ir à luta. Ou há uma mudança de atitude do Governo, ou vamos ter uma primavera e verão bem quentes”.

Sónia M.Lourenço Expresso 29 de dezembro 2018