Doutorados ainda não sabem se vão ganhar 1.201 ou 3.192 euros

Alguns doutorados em Portugal ainda não sabem se vão para a carreira geral ou de investigação. A diferença é de quase dois mil euros brutos.

Os investigadores do Laboratório Nacional de Engenharia Civil (LNEC) e de outros serviços ainda não sabem se vão entrar na carreira de técnico superior, com um salário de 1.201 euros brutos por mês, ou na carreira de investigação científica, com um salário de 3.192 euros. Isto, quase um ano depois do prazo de conclusão do programa de regularização de precários do Estado (PREVPAP). E mesmo nos casos em que concluíram o doutoramento há vários anos, avança investigação do Negócios.

”Apesar de o processo ter arrancado em Maio de 2017 e de estas pessoas terem recebido parecer positivo por parte das comissões de avaliação bipartida e assim o vínculo ter sido reconhecido como ilegal, e ter sido ultrapassado o prazo para a conclusão de todo o programa (Dezembro de 2018), o Governo resolveu em Agosto publicar um despacho que diz que será criada uma nova comissão para avaliar se os trabalhadores dos laboratórios do Estado com doutoramento e parecer favorável tiveram funções que “correspondem à carreira de investigação científica” ou que correspondem “à carreira técnica superior””, refere o Negócios.

Nos termos desse despacho, as comissões deveriam ter comunicado aos laboratórios os pareceres sobre a carreira desses trabalhadores no prazo de dois meses, ou seja, até 22 de Outubro. Só que no LNEC, onde os primeiros pareceres que reconhecem o vínculo ilegal foram homologados pelas Finanças e pelo Trabalho em meados de Outubro (sete meses depois de serem homologados pelo Ministério das Infraestruturas), os bolseiros garantem que ainda não ouviram falar da comissão. “Estamos num limbo”, resume um dos membros da comissão de bolseiros do LNEC ao Negócios.

A lei explica que as pessoas devem ser integradas na carreira “correspondente às funções exercidas” e a comissão de bolseiros garante que as cerca de cinquenta pessoas em causa no LNEC desempenharam efectivamente funções de investigadores.

Os bolseiros não entendem para que serve a comissão quando “o dirigente sabe o que as pessoas estão a fazer” até porque “há uma avaliação anual” do trabalho. Por outro lado, o incumprimento de prazos e o surgimento de novas etapas também geram desconfiança sobre este processo.

De acordo com a comissão de bolseiros – que representa cerca de uma centena de bolseiros que nalguns casos trabalham no LNEC há três anos e noutros há 20 – há 35 investigadores que já tinham o doutoramento à data de apresentação do requerimento (em 2017) e que foram notificados sobre o arranque do início do processo de avaliação de funções, segundo a investigação do mesmo jornal. Já as cerca de 16 pessoas que concluíram o doutoramento entretanto ou que ainda o estão a tirar nem sequer foram avisadas, e temem por isso ser empurradas para a carreira de técnico superior, independentemente das suas efectivas funções.

Há ainda uma terceira questão levantada. O despacho explica que o objectivo da nova comissão é proporcionar aos dirigentes “assessoria qualificada” que garanta “imparcialidade” e “igualdade de tratamento” na integração nas carreiras. Contudo, houve concursos lançados para a carreira de investigação, com um salário de 3.192 euros, meses antes da criação desta comissão, tanto no Instituto Hidrográfico como no Instituto Ricardo Jorge, que está aliás abrangido pelo despacho (juntamente com o LNEC, o INIAV e o IPMA). O Ministério das Finanças, que em Setembro disse ao Público que o parecer da nova comissão será vinculativo, não explicou ao Negócios esta aparente contradição.

O Negócios enviou as questões sobre este caso ao Ministério das Infraestruturas e Habitação (MIH), que tutela o LNEC, mas não obteve respostas. Os Ministérios do Trabalho e das Finanças, que têm coordenado o programa, também não esclareceram os resultados dos trabalhos que a comissão criada pelo despacho deveria ter concluído há um mês.

TitiAna Barroso 22 Nov 2019, Jornal de Negócios