"Acho que vão ficar poucos doutorados sem ocupação" - Entrevista a Paulo Ferrão

Paulo Ferrão Presidente da Fundação para a Ciência e a Tecnologia admite situação de "pleno emprego". FCT lança em fevereiro concurso para 950 bolsas de doutoramento. Pagos cem milhões para projetos

Converter bolsas em contratos de trabalho, "o grande sinal desta legislatura", frisa o presidente da Fundação para a Ciência e a Tecnologia (FCT).

Que permitirá, acredita Paulo Ferrão, uma situação de pleno emprego na Ciência nacional. Que, hoje, afirma, "está mais difícil de gerir".

O Orçamento do Estado (OE) para 2019 contempla um aumento de 11,5% nas verbas a serem investidas pela FCT, num total de 617 milhões de euros. É uma aposta clara na Ciência?

É uma prioridade no investimento na Ciência e corresponde ao esforço que se está a fazer na promoção da contratação das pessoas.

O emprego científico absorve quase um quinto, certo?

Agora até vai ser mais. É absolutamente necessário para honrar a promessa de contratação de cinco mil doutorados até ao final da legislatura. Temos 1800 a 1900 na norma transitória, 500 do concurso individual, 400 do institucional e cerca de 1600 dos projetos.

Falamos de reforço de verbas e de contratações num ano conturbado, com manifestações e críticas de investigadores. Não lhe causa estranheza?

O que tenho visto é alguma contestação pontual, mas não massiva. Vamos criar oportunidades de contratação para a grande parte de doutorados que temos no país. Até tenho algum receio que para algumas áreas nem haja doutorados suficientes para preencher as posições. Vejo que neste momento temos condições...

... de pleno emprego?

Sim. Acho que vão ficar provavelmente poucos doutorados, até espero mesmo que nenhum, sem ocupação. É claro que os números globais são uma coisa, área a área é outra. Há áreas onde há multa falta e outras onde não haverá tanta.

O que também dependerá das instituições de ensino superior.

A FCT está agora a financiar os empregos, mas quem será o seu garante são as instituições. Na avaliação das unidades que se está a processar, iremos dar mais 400 posições. E é esta a mudança que queremos ir fazendo. Foi o grande sinal desta legislatura: transformar bolsas em contratos.

O concurso de estímulo ao emprego científico deixou 3600 investigadores de fora, nomeadamente dois prémios Pessoa (Irene Pimentel e Maria Manuel Mota). Como explica?

Tenho confiança na forma como a avaliação foi feita e, portanto, não a vou discutir. São processos muitos complexos e a complexidade é, de facto, um problema. Este concurso teve 25 painéis e mais de 370 avaliadores. Houve excelentes candidaturas e houve pessoas que não puderam ficar entre os 500 e que eram muito boas.

Tiveram pedidos de audiência para contestar essas decisões?

Dessas pessoas mais faladas, umas pediram, outras não. Tudo isto demora imenso tempo, ainda não há decisão. Estes processos de audiência prévia são outra avaliação.

Disse que iria abrir um novo concurso ainda este ano. Quando? E com quantas posições?

Sim, vamos abrir ainda em dezembro e é igual ao concurso anterior. Ainda não está definido o número de posições, mas há de ser menos do que abrimos agora [500].

E vão abrir concurso para bolsas de doutoramento em 2019?

Temos um desejo profundíssimo de que haja regularidade nos concursos. Mas a maioria deles não está nas nossas mãos garantir, porque são parcerias com os Programas Operacionais Regionais e outros fundos europeus. Mas posso anunciar que vamos ter uma regularidade absoluta. Vamos abrir o concurso de bolsas de doutoramento sempre no final de fevereiro, todos os anos.

E quantas bolsas?

Um número idêntico ao do ano passado, 950, à volta disso. Reativamos as parcerias com o Carnegie Mellon e o MIT e algumas destas bolsas podem ser em parceira. Ou seja, o estudante tem a hipótese de passar no MIT até um ano.

Para quando está prevista a conclusão do processo de avaliação das unidades de investigação?

É um processo que se prolongará pelo menos até meados do próximo ano. Já comunicamos a todas as unidades que o financiamento se prorrogava por mais um ano. Será financiado pela FCT em OE.

No concurso de projetos foram aprovadas 1618 candidaturas com 375 milhões de euros. Qual o ponto de situação?

Aumentamos o adiantamento de 15% para 30%. Estamos a falar do maior concurso de projetos de sempre, com mais de 300 milhões de financiamento a três anos. O que significa que aumentamos de 50 para mais de cem milhões de euros a injeção financeira que demos às unidades já. Já pagamos mais de cem milhões às instituições. E isso deu um alívio financeiro muito grande.

Falou de estabilidade e regularidade, pontos abordados no Manifesto pela Ciência, onde se fala da atuação da FCT. O seu nome consta como subscritor. Por que razão o subscreveu?

Sim, subscrevi. Não há ali nada com que não concorde. Hoje, a Ciência está mais difícil de gerir. Quando se diz, no manifesto, que a FCT deve ter mais autonomia é claro que eu concordo com isso.

Como está a constituição da Agência de Investigação Clínica e Inovação Biomédica?

Foi anunciada para o Porto e é no Porto, não estando completamente claro onde. No princípio de dezembro, os sócios-fundadores irão ter uma reunião para tentar, ainda este ano, nomear uma direção e pôr a agência a funcionar. A ideia é estar operacional em janeiro.

Joana Amorim - Jornal de Notícias | 26.11.2018