Portugal pagou caro, em termos do seu desenvolvimento, medidas que contribuíram para diminuir a qualidade do corpo docente.

Os dados constantes nas Estatísticas da Educação 2016/2017 mostram que 60% dos professores do pré-escolar ao secundário têm 45 ou mais anos de idade. Ou seja, cerca de 96 mil, mais de metade dos docentes atuais, vão-se aposentar ao longo das próximas duas décadas. Apesar da diminuição expectável do número de alunos, é de esperar que o ritmo de recrutamento de novos professores aumente, com maior expressão no ensino público, pois é neste que o envelhecimento da classe docente é mais pronunciado – neste sistema apenas 3% têm idade inferior a 35 anos.

É reconhecido que nenhum sistema educativo pode ser melhor do que os seus professores. Um artigo recente de Eric Hanushek, Marc Piopiunik e Simon Wiederhold, investigadores na Universidade de Stanford e da Universidade de Munique, publicado na prestigiada revista The Journal of Human Resources, mostra que as competências cognitivas médias dos professores em alguns dos países com melhores resultados nos testes internacionais PISA, que medem o desempenho dos alunos, caso do Japão e da Finlândia, são superiores à média das competências cognitivas dos adultos com mestrado ou doutoramento no Canadá (país usado como referência). Em contraste, as competências cognitivas dos professores de países como a Itália ou a Rússia, cujos alunos obtêm pior performance nos testes PISA, estão, em média, ao nível de um canadiano com um curso pós-secundário não superior. Infelizmente, os dados usados neste estudo para medir as competências cognitivas em literacia e numeracia dos adultos (o teste PIACC) não incluem informação para Portugal, uma vez que o nosso país não participou na última edição do estudo (2011-2012). As conclusões apresentadas no estudo são claras e robustas: quanto maior for a capacidade cognitiva do professor melhor será a capacidade cognitiva dos alunos, nomeadamente para alunos oriundos de meios mais desfavorecidos para os quais o contexto familiar não compensa eventuais falhas nas aprendizagens obtidas na escola.

É, pois, necessário planear o acesso à profissão docente, de forma a garantir a existência de muito bons professores porque deles depende o futuro da educação, enquanto base do desenvolvimento social e económico. Porém, os dados que temos quanto ao futuro são preocupantes: de acordo com o estudo da OCDE Effective Teacher Policies, divulgado em junho deste ano, apenas 1,3% dos jovens portugueses que desejam prosseguir estudos no ensino superior têm como objetivo seguir a profissão de professores, tendo a maioria destes desempenhos abaixo da média. Estes números estão de acordo com os resultados do concurso nacional de acesso ao ensino superior. No ano passado, das 789 vagas existentes no ensino superior público para licenciaturas em Educação Básica, requisito para aceder aos mestrados profissionalizantes de acesso à docência do pré-escolar ao 2.º ciclo do ensino básico, 82% estavam em pares curso-estabelecimento com nota mínima de entrada inferior a 13 valores e 37% com nota mínima inferior a 11 valores! Como refere o relatório do Conselho Nacional de Educação sobre a condição docente, “...o declínio do reconhecimento e da imagem social dos docentes enfraquece as aprendizagens, o ensino e a sociedade”.

É, pois, claro que o reforço do prestígio e da cultura profissional docentes tem impacto na melhoria das aprendizagens, não só dos alunos atuais, mas também nos alunos futuros. Para ter bons professores, é preciso atrair os melhores alunos para a profissão pelo que é urgente uma estratégia para restaurar a confiança dos docentes e valorizar socialmente a sua função. Uma importante componente desta estratégia será quanto ao método de seleção e recrutamento de professores. Vários estudos indicam que os sistemas educativos com níveis elevados de desempenho recorrem a provas de seleção dos candidatos a professor, em conjunto com métodos de avaliação das competências profissionais dos docentes durante um período de indução ou probatório. No caso português, o Estado prescindiu do direito de selecionar os candidatos à docência. O recrutamento depende essencialmente de uma classificação ordenada a nível nacional, determinada pela média final do curso e pelos anos de experiência. Em momento algum estão previstas entrevistas com os responsáveis das escolas para aferir a motivação e a adequação dos candidatos à docência, corresponsabilizando no processo as escolas e os professores, como no caso da Bélgica, Dinamarca, Estados Unidos, Holanda, Hungria, Islândia, Israel, República Checa e Suécia, ou provas de âmbito nacional nos domínios da literacia e numeracia, existentes num grupo significativo de países europeus.

Conclui-se, assim, que se há área de política pública com impacto no muito longo prazo é esta. Portugal pagou caro, em termos do seu desenvolvimento, medidas que contribuíram para diminuir a qualidade do corpo docente. Da expulsão dos jesuítas pelo Marquês do Pombal, ao recurso aos regentes escolares pelo Estado Novo, a quem se exigia apenas o exame da quarta classe, o nosso país caiu várias vezes no mesmo erro. Pensar o país do futuro é pensar que os nossos netos serão ensinados pelos jovens que hoje procuram a profissão docente.

fonte:Publico
JOÃO CEREJEIRA
MIGUEL PORTELA