Maria João Rodrigues acusada de assédio moral

Ex-ministra do Emprego tem uma carreira política e académica dedicada aos direitos laborais

A eurodeputada do PS está a ser investigada depois de ter sido acusada de pressionar e humilhar ex-assistentes

Uma sensação de medo e de humilhação permanentes. Acessos de fúria constantes e injustificados. Pressões para que as suas assistentes não engravidem ou que então abdiquem de parte do salário. Ameaças de represálias para quem ousa contestar as regras impostas. É assim que é descrito o ambiente de trabalho no gabinete de Maria João Rodrigues, eurodeputada do PS e presidente da Fundação Europeia para os Estudos Progressistas (FEPS), agora no centro de uma investigação em curso no Parlamento Europeu por assédio moral no trabalho. A socialista nega.

A ex-ministra do Emprego de António Guterres, com uma carreira política e académica dedicada aos direitos laborais e sociais, é acusada de impor um clima de opressão dentro de portas que já terá motivado a saída de vários colaboradores. De acordo com testemunhos recolhidos pelo Expresso, Maria João Rodrigues exige total disponibilidade aos seus assistentes, inclusive para lá do horário laboral e aos fins de semana. Humilha os subordinados e terá dito que em determinados trabalhos “as pessoas não podem ter mais filhos”. Certa altura terá mesmo acusado uma assistente de lhe provocar “custos políticos” por ter tido um terceiro filho. Episódios corroborados ao Expresso por várias fontes, que pediram anonimato por medo de represálias.

Estas e outras acusações estão agora a ser investigadas pelo Comité de Assédio do Parlamento Europeu, num processo confidencial que, sabe o Expresso, tem quase 100 páginas. Confrontada com o conteúdo das queixas apresentadas contra ela, a eurodeputada garante que todas as suas relações de trabalho são pautadas pelo “respeito e confiança mútuos”.

Apesar de ser uma queixa generalizada, a socialista só assume ter contactado uma assistente fora do horário laboral e apenas porque se confrontou com “contratempos relacionados” com viagens de trabalho. “Quanto às licenças de maternidade e de doença que ela [a assistente queixosa] pediu por vinte meses, faço questão de dizer que as respeitei integralmente, tendo reorganizado a minha equipa para esse efeito”, assegura, por escrito, Maria João Rodrigues.

“No cockpit da Europa”

Na resposta que enviou ao Expresso, Maria João Rodrigues reduz a investigação em curso à denúncia de uma única assistente. A verdade é que as queixas de assédio são subscritas por mais pessoas. Segundo estas testemunhas, Maria João Rodrigues, que foi a eurodeputada relatora do Pilar Europeu dos Direitos Sociais — onde defende como prioridade que homens e mulheres devem poder conciliar a vida profissional e privada —, fabrica de forma sistemática “falsas urgências”, ofende publicamente os funcionários e dirige-se aos assistentes invariavelmente aos gritos. “Uma vez, durante uma reunião de trabalho, pediu a uma assistente que trouxesse um documento rapidamente. Quando ela chegou, gritou: ‘Too late!’ E atirou os papéis para o chão”, conta um antigo colaborador.

Não será caso único. Numa troca de correspondência a que o Expresso teve acesso, Maria João Rodrigues pediu a uma colaboradora externa ao Parlamento Europeu que se encontrava de baixa que entregasse um determinado relatório “preferencialmente” dentro de uma hora — algo que a funcionária fez no dia seguinte, pedindo desculpa pelo atraso, mas lembrando que se encontrava em casa... há uma semana.

De acordo com os mesmos relatos, Maria João Rodrigues acusa com frequência os seus colaboradores de lhe estarem a impor “custos políticos” e diz várias vezes que “está no cockpit da Europa” como forma de pressionar os seus assistentes. Os que resistem são publicamente destratados. “Chegou a marcar uma reunião de emergência depois de um colaborador ter argumentado que não tinha de partilhar com ela o que estava a fazer à noite e quando já não estava no trabalho”, conta uma fonte ouvida pelo Expresso. Aqueles que sinalizam vontade de sair são ameaçados com o fim das respetivas carreiras.

Maria João Rodrigues foi confrontada com estas e outras denúncias, mas deixou várias perguntas do Expresso sem resposta. Desafiada a esclarecer se deixará o Parlamento Europeu caso venha a ser considerada culpada, a socialista diz apenas aguardar “com tranquilidade a conclusão da investigação”.

Semanário Expresso - Miguel Santos Carrapatoso e Susana Frexes