IEFP condenado a pagar subsídios de férias e de Natal a formadores precários

Dezenas de formadores que passaram aos quadros do IEFP no âmbito do programa de regularização de precários já avançaram com queixas para tribunal a reclamar os subsídios que não lhes foram pagos durante os anos em que estiveram a falsos recibos verdes. Primeira sentença abrange 12 trabalhadores.

O tribunal de Vila Real condenou o Instituto do Emprego e Formação Profissional (IEFP) a pagar os subsídios de férias, de Natal e de refeição a 12 formadores precários abrangidos pelo Programa de Regularização Extraordinária de Vínculos Precários do Estado (PREVPAP). Em causa está um total de 432,4 mil euros relativos aos subsídios a que estes formadores tinham direito nos anos em que estiveram a recibos verdes.

O Juízo do Trabalho de Vila Real considerou que os formadores, com os quais o IEFP celebrou consecutivos contratos de aquisição de serviços de formação entre Março de 2013 e 30 de Abril de 2020, deviam ser reconhecidos e declarados como trabalhadores do instituto, dando como provado que estavam em causa falsas prestações de serviços.

Assim, refere a sentença a que o PÚBLICO teve acesso, o IEFP é condenado a pagar “as quantias de férias, subsídio de férias e de Natal, bem como os subsídios de refeição, no montante global de 432.368,50 euros, acrescido dos respectivos juros de mora, desde o final de cada ano civil em que os pagamentos deveriam ter sido efectuados e os vincendos após citação e até efectivo pagamento”.

O IEFP ainda pode apresentar recurso. Questionada pelo PÚBLICO, fonte oficial respondeu que o instituto “encontra-se a analisar a sentença proferida pelo Tribunal do Trabalho de Vila Real, dentro do prazo legal para decisão de recurso”, acrescentando que “há outros processos a correr” noutros tribunais do país.

Esta é uma das primeiras sentenças conhecidas, mas Vítor Peixoto, advogado que representou os formadores neste processo, garante que tem a correr mais de uma dezena de processos abrangendo vários trabalhadores em Faro, Santarém, Portalegre, Viana do Castelo ou Braga. Todos eles dizem respeito a formadores que, no âmbito do PREVPAP, foram reconhecidos como estando a assegurar necessidades permanentes sem terem o vínculo adequado.

“E tenho vários processos que ainda não avançaram porque algumas das pessoas que entraram para os quadros no âmbito do PREVPAP têm receio de intentar a acção e sofrer represálias”, destaca.

Também o Sindicato dos Trabalhadores da Administração Pública (Sintap) assegura que tem “algumas dezenas de processos em curso”. O dirigente José Abraão adiantou ao PÚBLICO que, em alguns casos, os formadores “estão a reclamar direitos associados a uma relação de trabalho que satisfazia necessidades permanentes dos serviços”, como aconteceu no processo de Vila Real, mas também há acções relacionadas com a contagem do tempo para efeitos de posicionamento nas respectivas carreiras.

Tendo em conta que o PREVPAP permitiu a regularização da situação contratual de 500 formadores que entraram para a carreira de técnico superior e que as acções em curso provêm deste universo, o impacto destes processos poderá ser significativo. Assumindo o valor que o tribunal de Vila Real condenou o IEFP a pagar e que ronda os 36 mil euros por cada um dos formadores que intentou a acção, se todos os formadores exigissem o pagamento destes subsídios o instituto teria de desembolsar um valor próximo de 18 milhões de euros.

Nos processos que estão a correr nos tribunais, o IEFP tem sempre apresentado contestação, alegando que, apesar dos pedidos formulados pelos autores da acção respeitarem ao reconhecimento da existência de contratos de trabalho, estão em causa contratos de trabalho em funções públicas. Por isso, defende o IEFP, o tribunal competente para dirimir o litígio é o tribunal administrativo e não o tribunal do trabalho.

Foi o que aconteceu com o processo de Vila Real, em que o instituto recorreu para o tribunal da Relação de Guimarães que acabou por decidir que “ainda que o réu seja uma pessoa colectiva de direito público, invocando os autores uma relação de trabalho regulada pelo Código do Trabalho e não pela Lei Geral do Contrato de Trabalho em Funções Públicas, é competente para conhecer da respectiva acção o tribunal judicial de competência especializada (Juízo do Trabalho) e não o tribunal administrativo”.

Além dos processos a reclamar o pagamento de créditos laborais relativos ao período em que os formadores estiveram com contratos de prestação de serviços, deram também entrada nos tribunais acções relacionados com a contagem do tempo de serviço.

Quando regularizou a situação dos 500 formadores que tiveram luz verde do PREVPAP, o IEFP apenas contabilizou o tempo de serviço de 2015 em diante, apesar de muitos deles terem estado dez ou 20 anos a recibos verdes.

O facto de o IEFP apenas considerar seis anos de serviço tem consequências no nível salarial e na atribuição de um conjunto de direitos (como um dia de férias extra por cada dez anos de trabalho) transversais aos funcionários públicos.

Tal como o PÚBLICO noticiou em Junho de 2021, o IEFP argumenta que “os requisitos para a regularização de vínculo dos formadores do IEFP eram o exercício de funções na janela temporal (1 de Janeiro a 4 de Maio de 2017) e o desempenho de funções em, pelo menos, um dos anos relevantes (2015 a 2017) em horário completo (1000 horas/ano)”. Por isso, “temos que considerar que as prestações de serviço (ou outras formas de contratação) anteriores a 2015 não podem relevar como tempo de serviço para efeitos de carreira porque estão fora dos anos que o legislador considerou relevantes para o preenchimento da necessidade permanente do serviço”.

Raquel Martins - 10 de Maio de 2022, Público