Empresas com teletrabalho só têm 31% das pessoas em casa

Inquérito feito pelo Ministério do Trabalho mostra que dois terços das 10.300 empresas que responderam não recorrem ao teletrabalho. Nas empresas que aplicam este regime, só 31% dos trabalhadores estão em casa.

O Ministério do Trabalho lançou um inquérito a um universo representativo de empresas para perceber como está a ser aplicado o teletrabalho e conclui que dois terços das 10.300 empresas que responderam não recorrem a esta modalidade. Só um terço afirmou aplicar o teletrabalho e mesmo nestes casos a percentagem de trabalhadores a exercer as suas funções a partir de casa não vai além dos 31%.

O inquérito foi conduzido pelo Gabinete de Estratégia e Planeamento (GEP) do Ministério do Trabalho, que questionou por email um conjunto de empresas (que estavam a laborar em Outubro e entregaram declarações à Segurança Social) sobre se tinham pessoas em teletrabalho na semana de 16 a 20 de Novembro – já depois da entrada em vigor do diploma que torna obrigatório o teletrabalho, desde que seja possível, nos concelhos de maior risco de contágio de covid-19.

Responderam 10.300 empresas e a conclusão vai ao encontro do que o primeiro-ministro disse no fim-de-semana passado, alertando para “um grande incumprimento” do teletrabalho obrigatório.

Os dados foram apresentados com mais detalhe nesta quarta-feira pela ministra do Trabalho, Ana Mendes Godinho, no final da concertação social. Entre as empresas que responderam, são as de grande dimensão que mais declararam ter teletrabalho. A título de exemplo, só 24% das empresas de pequena dimensão (1 a 9 trabalhadores) declararam ter pessoas a trabalhar a partir de casa, enquanto nas empresas maiores a taxa de resposta positiva oscila entre os 63% (entre 100 e 249 trabalhadores) e os 87% (500 e mais trabalhadores). 

A distribuição das empresas com teletrabalho concentra-se nas áreas metropolitanas de Lisboa (32%) e do Porto (22%), sendo de destacar também Coimbra (14%).

Os sectores de actividade onde o teletrabalho é mais usado são os serviços e serviços de informação (89% das empresas que afirmam ter teletrabalho são desta área), consultoria e programação informática (86%) e telecomunicações (83%).

Desde 4 de Novembro, o teletrabalho é obrigatório, sempre que as funções em causa o permitam e o trabalhador disponha de condições para as exercer, nos concelhos onde há maior risco de contágio. Se a empresa entender que não estão reunidas as condições para a adopção do teletrabalho, terá de comunicar “fundamentadamente e por escrito” a cada um dos trabalhadores os motivos. Quando discordar dessa avaliação, o trabalhador tem três dias úteis para pedir a intervenção da Autoridade para as Condições do Trabalho (ACT), a quem cabe verificar se factos invocados pela empresa têm fundamento e tomar uma decisão no prazo de cinco dias.

O PÚBLICO procurou saber junto da ACT quantos trabalhadores pediram intervenção, ao abrigo da lei em vigor, mas não teve resposta. Já nesta quarta-feira, na conferência de imprensa que se seguiu à concertação social, colocou a questão à ministra do Trabalho, que não respondeu.

O Sindicato dos Inspectores do Trabalho fala em dezenas de pedidos e ao PÚBLICO têm chegado relatos de trabalhadores que, entre Março e Maio, estiveram em teletrabalho e que agora receberam cartas do empregador a alegar que não é possível recorrer a esse mecanismo, mesmo nos concelhos de risco.

Ana Mendes Godinho precisou nesta quarta-feira que nas próximas duas semanas a ACT vai desenvolver uma acção de âmbito nacional para detectar eventuais incumprimentos do teletrabalho.

Na tentativa de sensibilizar as empresas para o recurso ao teletrabalho, os serviços do Ministério do Trabalho enviaram um email a cerca de 400 mil empresas alertando-as para a “obrigatoriedade de implementarem o teletrabalho nos casos em que as funções são compatíveis, caso se localizem nos concelhos dos níveis de risco elevado, muito elevado e extremamente elevado.

Raquel Martins - 26 de Novembro de 2020, Público