"Não paguei propinas para manter a casa"

Estudantes universitários brasileiros ficaram retidos no Porto por causa da pandemia e passam por várias dificuldades, com a desvalorização do real.

"Tive que parar de pagar as propinas para manter as coisas em casa", desabafa Vítor Laureano, natural da Bahia, no Brasil. Como ele, centenas de jovens vieram do Brasil até ao Porto para a experiência de estudar num país diferente e de conhecer os cantos a uma cidade nova, mas a pandemia de covid-19 trocou-lhes as voltas.

Sem voos para voltarem a casa, com as fronteiras fechadas e com o valor do real a cair a pique face ao euro, muitos tiveram de lutar para conseguir pagar contas e propinas, sem saber bem o que esperar do amanhã.

O mais difícil durante os meses de pandemia, admite Vítor, que viu a mãe e o padrasto perderem o emprego por estes meses, foi a "incerteza de conseguir passar por esta fase".

O jovem de 24 anos quer ficar no Porto, mas este percalço talvez lhe dificulte os planos. "Em agosto o dinheiro não vai surgir magicamente e, na hora de renovar o título de residência, o Serviço de Estrangeiros e Fronteiras quer as propinas pagas", lembra.

O sufoco financeiro foi o principal problema para os jovens estudantes que, por cá, pouco ou nada puderam fazer a não ser esperar.

Viver estes dois meses "preso" no Porto foi um "desafio", conta Alberto Filho, 22 anos, estudante no Mestrado Integrado em Engenharia Eletrotécnica e de Computadores, que não conseguiu voo antes do fecho das fronteiras e que acabou por ter de pedir ajuda para se manter no Porto.

"Os custos aumentaram muito. Em comparação, quando aqui cheguei, 3000 reais eram 700 euros e agora, menos de um ano depois, valem muito menos que 500 euros", explica.

POUPAR NA COMIDA

Não só as propinas começaram a ficar por pagar. Muitos estudantes tiveram de procurar casas com rendas mais baratas e apertar o cinto na hora de ir ao supermercado.

"Nem tentei comprar um bilhete pelas dificuldades que todos estavam a ter", admite Anita, 21 anos, que veio de Rio Grande do Sul em fevereiro para um semestre no Porto. "Foi muito difícil. Tive de cortar muito os meus gastos porque os custos da alimentação aumentaram também com o fecho das cantinas das faculdades", lembra.

Por se aperceber destes casos, a Universidade do Porto criou uma bolsa para ajudar os que estavam em situações mais vulneráveis. Contudo, os apoios não foram suficientes para todos.

Eu e vários estudantes brasileiros vivenciamos muito sufoco", relata Bruno Amorim, 26 anos, aluno na Faculdade de Letras que precisou de pedir ajuda à família para continuar no Porto. "Mas a Universidade ofereceu suporte em vários âmbitos como psicológico, financeiro, social e isso fez toda a diferença" sublinha o estudante, apesar de não ter sido contemplado com o apoio.

236 alunos apoiados

A Universidade do Porto concedeu apoios a 236 estudantes, no valor total de 82 600 euros. Destes, 70% são estudantes internacionais, dos quais 103 brasileiros, a nacionalidade mais representada entre os alunos apoiados.

Fase extra

A Universidade do Porto decidiu abrir uma nova fase de apoios, que está ainda em fase de avaliação de candidaturas, para alargar esta ajuda extraordinária a um maior número de estudantes.

Ana Sofia Rocha - 23 Junho 2020  Jornal de Notícias