Há empresas a adiar o regresso de alguns trabalhadores

A recomendação do Governo é que o teletrabalho se mantenha obrigatório até final de maio. Por isso, as empresas de serviços começaram a fazer os planos para o regresso dos trabalhadores aos escritórios. Mas com imposições de distância e, por questões de proteção, muitas empresas admitem adiar mais um pouco a presença do pessoal. E há já quem veja neste período de confinamento ensinamentos para o futuro.

Google e Facebook prolongaram o regime de teletrabalho a todo o ano de 2020. A Microsoft já fez saber que é assim que manterá os seus trabalhadores até outubro. E o Twitter admitiu o teletrabalho indefinidamente. Para já, em Portugal, a orientação é que até final de maio o teletrabalho continue a ser obrigatório, sempre que a função o permita, e a partir de junho, segundo disse já o primeiro-ministro, António Costa, é que mais pessoas possam ir para o local de trabalho. Esta semana, segundo dados da PSE, já se notam mudanças ao nível da mobilidade dos portugueses.

Muitos são já os que terão regressado à empresa. A maior parte das companhias de serviços, contactadas pelo Negócios, só tenciona fazê-lo a partir de 1 de junho. Mas há quem antecipe um período mais longo de trabalho à distância. É unânime, no entanto, a promoção do regresso de forma gradual, garantindo as condições de distanciamento e de proteção.

“Tendo em conta que temos cerca de 4.000 m2 de espaço de escritório, conseguimos garantir um regresso seguro”, salienta ao Negócios António Miguel Ferreira, líder da Claranet, explicando que, durante o mês de junho, conta ter já 50% dos colaboradores no escritório para, na última fase, em julho, atingir os 75%. Isto depois de ter iniciado em maio o desconfinamento, com o regresso de até 25% dos trabalhadores, que, em Portugal, são cerca de 700. O regresso começou com “os colaboradores que não consigam desempenhar as suas funções totalmente em teletrabalho e não tenham crianças pequenas a cargo”. Uma coisa parece já certa na cabeça do gestor: “Não regressaremos mais ao escritório na totalidade, a níveis de presença semelhantes aos pré-covid (95%).”

No plano da Tabaqueira, que ainda não tem a certeza de que marcará o regresso para junho, “os trabalhadores pertencentes a grupos de risco e os que têm crianças em idade escolar e sujeitas ao ensino virtual à distância continuarão em teletrabalho”, diz. Os primeiros por tempo indeterminado.

É com convicção que a Konica Minolta antecipa que “vamos manter o teletrabalho”, iniciado antes do estado de emergência. Patrícia Pereira, diretora de recursos humanos, conta que a empresa tinha começado no início do ano um projeto-piloto de flexibilidade horária e de teletrabalho. “A covid-19 foi claramente um agente da transformação, que no nosso caso ajudou a perceber que o teletrabalho pode ser alargado a muito mais equipas do que as que estávamos a equacionar aquando do desenvolvimento do projeto-piloto”, afirma a gestora, explicando que cerca de metade da equipa que totaliza 220 pessoas vai manter-se em teletrabalho.

A maior parte do pessoal da Intelidus regressará no próximo mês, dependendo dos progressos e números da covid-19. Em junho, “prevemos retomar funções na empresa com cerca de 80% dos nossos trabalhadores”, mas José Veiga, presidente do grupo que detém a EuPago e a Insania, admite também aproveitar a experiência do trabalho à distância. “Daqui para a frente vemos o teletrabalho como a possibilidade válida e vantajosa para a empresa e para alguns dos nossos funcionários que podem exercer as funções a partir de casa e que apresentem produtividade neste formato”, mas não a tempo inteiro. José Veiga explica que “esta é uma forma de trabalho que não funciona para todas as pessoas e que, não havendo tanto controlo sobre as métricas impostas, poderá em alguns casos afetar o desempenho”, acrescentando ainda como entrave “os problemas psicológicos associados ao facto de estarmos confinados sempre no mesmo espaço e durante muito tempo”.

A experiência da IBD Global será também aproveitada. “Verificámos durante os últimos dois meses que as pessoas mantêm a produtividade mesmo trabalhando a partir de casa”, assume Ricardo Costa, CEO da IBD Global, garantindo que, por isso, e se essa for a vontade do trabalhador manterá a prática, ainda que esteja já a trabalhar no plano que irá propor aos trabalhadores – a empresa emprega 107 pessoas, 37 das quais em Portugal – para vigorar a partir de 1 de junho. É esta a data que marca o regresso “gradual” dos trabalhadores da Primavera BSS, admitindo Rita Cadillon, diretora de recursos humanos, que “nesta altura os planos são muito voláteis e sujeitos a alterações”. A Nestlé opta por manter o trabalho à distância durante o mês de junho, avaliando, após esse período, e mensalmente, a situação, diz Maria do Rosário Vilhena, responsável pelos recursos humanos.

É numa base voluntária que a Euronext vai proceder ao regresso em junho. “Iremos dar a opção aos colaboradores de poderem voltar ao escritório, numa base voluntária, e na medida das restrições que estamos a implementar no escritório, de distanciamento dos postos de trabalho, e de outras medidas de segurança”, revela fonte oficial, esclarecendo que as recomendações das autoridades de saúde e do Governo ditarão a situação a partir de julho.

Situação avaliada

O Colégio Luso-Internacional do Porto (CLIP) fará regressar a equipa de professores, assistentes e serviços de apoio a 1 de junho, dia em que o pré-escolar reabre. Mas todos os outros profissionais ficarão em teletrabalho até ao final do próximo mês, indo depois de férias.

O horizonte para a OutSystems é também o pós-verão. “Terminado o mês de maio, pretendemos que o regime de teletrabalho se mantenha como preferencial, pelo menos até setembro de 2020”. É que, mesmo admitindo que “ter mais de 1.000 colaboradores a trabalhar remotamente, em diferentes geografias e diferentes fusos horários é um desafio”, a tecnológica diz que tem “vindo a responder de forma muito positiva”, salienta Alexandra Monteiro, que tem o pelouro dos recursos humanos.

A Endesa mantém o trabalho à distância “durante as próximas semanas ou meses, avaliando sempre os constrangimentos da situação sanitária”, sendo que o regresso, gradual, será condicionado pela capacidade dos edifícios”.

O futuro?

Da tecnológica Edigma vem a garantia de que “o teletrabalho não se tem apresentado como um obstáculo ou uma ameaça, mas sim uma oportunidade de desenvolver novas capacidades e fazer a organização crescer como um todo”, diz o CEO Miguel Oliveira.

Essas oportunidades levam o Crédito Agrícola a admitir ser “imprescindível modernizar e reforçar a nossa proposta de valor em matéria de gestão de recursos humanos disponibilizando aos colaboradores regimes mais flexíveis, adequados às suas necessidades individuais e simultaneamente mais alinhados com os compromissos de sustentabilidade que assumimos”. Até pela redução de viagens dos trabalhadores para o emprego. “Temos pessoas que perdem duas horas por dia nas deslocações”, pelo que, acrescenta Ricardo Costa, “acreditamos que serão muito mais felizes se puderem dedicar essas duas horas à família, e, sendo mais felizes, por certo vão estar mais motivadas a executar as funções que desempenham a nível profissional”.

Ana Sanlez | António Larguesa Patrícia Abreu | Rui Neves Sara Ribeiro Rita Atalaia

Negócios 20 de maio de 2020