Tribunal volta a condenar reitor da Fernando Pessoa por desvio de fundos

Salvato Trigo foi condenado por ter desviado quase 2,2 milhões de euros da fundação que detém aquela instituição privada de ensino superior em benefício próprio e da sua família.

O Tribunal Judicial da Comarca do Porto voltou a condenar esta sexta-feira o reitor da Universidade Fernando Pessoa, Salvato Trigo, por este ter desviado, através de uma empresa sua, quase 2,2 milhões de euros da fundação que detém aquela instituição de ensino privado em benefício próprio e da sua família. Um ano e três meses de prisão, com pena suspensa por igual período, foi a sanção determinada. 

O Juízo Local Criminal do Porto já tinha condenado Salvato Trigo em Maio de 2018, mas, em Novembro de ano passado, o Tribunal Relação do Porto decidiu invalidar a condenação do reitor da Universidade Fernando Pessoa, considerando insuficiente a fundamentação da sentença que lhe aplicara igualmente uma pena suspensa de prisão de um ano e três meses por um crime de infidelidade.

O tribunal voltou a dar como provados quase todos os factos que integraram a acusação, tendo, no entanto, considerado que o prejuízo da fundação que detém a universidade foi de, pelo menos, 2.197.991 milhões de euros (menos que os 3.033.056 milhões de euros calculados pelo Ministério Público). Salvato Trigo voltou a não comparecer em tribunal para ouvir a sentença e à saída o seu advogado não quis prestar declarações aos jornalistas.

O valor do prejuízo determinado pelo juiz Guilhermino Freitas, o mesmo que aceitou que o julgamento decorresse à porta fechada, corresponde ao que o magistrado já tinha dado como provado na  primeira sentença.

Além dos factos da acusação, o juiz também deu como provados vários factos apresentados pela defesa, nomeadamente que Salvato Trigo e a mulher garantiram pessoalmente diversos empréstimos que permitiram expandir o património da universidade que conta actualmente com um campus com mais de 30 mil metros quadrados e um hospital escola.

Foi notória a preocupação do juiz em fundamentar ainda melhor a nova decisão. Guilhermino Freitas realçou o enorme volume de documentos financeiros e contabilísticos que fazem parte do processo e sublinhou, por diversas vezes, a importância das conclusões das perícias feitas neste âmbito pela Polícia Judiciária e de um parecer do Núcleo de Assessoria Técnica da Procuradoria-Geral da República. O magistrado frisou esta sexta-feira durante a leitura da decisão que se tratam de elementos de prova “exaustivos e bem fundamentados”. E destacou igualmente o depoimento de três pessoas que diz terem respondido com isenção e credibilidade.

Tratam-se do inspector que fez a perícia da Judiciária, uma inspectora da autoridade tributária que acompanhou o caso e do técnico oficial de contas da fundação durante quase 20 anos, que saiu em litígio com Salvato Trigo. Foi este diferendo que, indirectamente, deu origem a esta investigação.

O juiz sublinhou que o que se avalia neste caso é a falta de racionalidade dos negócios efectuado pelo reitor da Fernando Pessoa enquanto presidente do conselho de administração da fundação que detém a universidade e salientou a estranheza dos vários negócios em causa implicarem sempre um prejuízo para a fundação e vantagens para a sociedade da família Trigo.

A acusação do Ministério Público descreve diversos esquemas que o reitor da Fernando Pessoa terá montado para fazer sair avultadas quantias das contas da fundação. Mais de três milhões de euros teriam sido canalizados para uma empresa, cujos sócios são o próprio Salvato Trigo, a mulher e os dois filhos – a Erasmo. Uma parte do dinheiro acabaria nos bolsos da família Trigo através da distribuição de lucros, uma operação vedada à fundação, devido ao seu estatuto.

O negócio mais prejudicial para a fundação foi a compra, em final de 2006, de uma casa, contígua à reitoria da universidade, que alberga actualmente a Escola de Pós-Graduações da instituição. O imóvel, localizado na Praça 9 de Abril, no Porto (conhecido como Jardim de Arca d´Água), foi comprado formalmente pela Erasmo, que, no entanto, como não tinha dinheiro disponível para pagar os 1,4 milhões de euros que os vendedores pediam, acabou por pedir um empréstimo de 1,2 milhões à própria universidade.

Insólito é que apesar de, num primeiro momento, ter adiantado a esmagadora maioria do dinheiro, a universidade acabou a fazer um contrato de arrendamento pelo prazo de dez anos com a Erasmo, que lhe cobrava 40 mil euros mensais para esta poder usar o imóvel. Apesar de ter sido a Erasmo a comprar a casa, foi a fundação que desembolsou os 584 mil de euros em obras que permitiram reparar a antiga moradia e adaptá-la para receber alunos. Só em 2007, calculou o Ministério Público, a Erasmo teve um rendimento de mais de um milhão de euros com a casa — nas obras e nas rendas —, o que representa “uma taxa de rentabilidade de cerca de 71% no primeiro ano”. 

Mariana Oliveira - 28 de Fevereiro de 2020, Público