Estudo elaborado pelo economista Eugénio Rosa, na sequência de um documento entregue ao Sindicato dos Trabalhadores da Função Pública, pelo Ministério das Finanças, numa reunião sobre aumentos salariais

http://eugeniorosa.com/Sites/eugeniorosa.com/Documentos/2019/55-2019-os-numeros-de-Centeno.pdf?ver=2019-12-15-083914-517

Nas negociações com os sindicatos da Função Pública sobre os aumentos de salários o governo, para justificar a sua recusa em aumentar os salários destes trabalhadores em 2020, que estão congelados desde 2009 (0,3% é uma provocação), divulgou um comunicado onde consta o seguinte quadro (…)

Segundo o governo, as progressões e revisões nas carreiras determinaram um aumento de despesa com os trabalhadores da Função Pública de 465 milhões € em 2018, de 666 milhões € em 2019 e, em 2020, o aumento de despesa determinados pelas progressões mais o aumento de apenas 0,3% nas remunerações destes trabalhadores, será, segundo o governo, de 715 milhões €. E daí conclui, procurando manipular a opinião pública, que o aumento médio por trabalhador foi de 2,2% em 2018, de 3,1% em 2019 e, em 2020, será de 3,2%.

E no comunicado que divulgou, não mostra a forma como chegou a tais valores, certamente porque pensa que, numa matéria tão importante para a vida de centenas de milhares de trabalhadores, não tem de dar explicações, e assim poderá apresentar os valores que quiser e não será contestado. Para além disso, também se “esqueceu” de informar no seu comunicado que há muitos milhares de trabalhadores das Administrações Públicas que não tiveram qualquer progressão na sua carreira porque ainda não tinham “10 pontos”. Mas assim vai a transparência de que tanto fala este governo. E é desta forma que procura virar a opinião publica contra os trabalhadores da Função Pública que há 10 anos têm os seus salários congelados.

OS NÚMEROS DO COMUNICADO DO GOVERNO NÃO BATEM CERTO COM OS DA DGAEP DO MINISTÉRIO DAS FINANÇAS. E A DIFERENÇA É DE CENTENAS DE MILHÕES DE EUROS

Para se poder avaliar a veracidade dos dados divulgados pelo governo no comunicado que distribuiu, observe-se o quadro seguinte construído com base nos dados divulgados pela Direção Geral da Administração e Emprego Público (DGAEP) do Ministério das Finanças

Quadro 2 – O aumento da despesa do Estado com os ganhos (inclui remuneração base e subsídios) dos trabalhadores da Administração Central segundo a DGAEP e segundo o comunicado do governo (..)

Segundo dados da DGAEP, se a análise se limitar aos aumentos apenas na Administração Pública Central (“Estado”) no período 2016/2019, como consequência das progressões nas carreiras conclui-se que o aumento efetivo na despesa foi de 324 milhões € em 2018 e de 272 milhões € em 2019 (596M€ nos 2 anos), e não 465 milhões € e 666 milhões € (1131M€ nos 2 anos) como o governo refere no seu comunicado (qd.1). Admitindo que aqueles valores eram repartidos por todos os trabalhadores do Estado, o que não aconteceu, pois, muitos milhares de trabalhadores não tiveram quaisquer progressões nas suas carreiras pois não tinham os “10 pontos”, o aumento médio seria de 1,7% em 2018 e 2019, e não de 2,2% e 3,1% como refere o governo no comunicado. Assim vai a transparência, de que este governo tanto fala, e não se olha a meios para manipular a opinião pública.

Analisemos agora a evolução dos salários para todas as Administrações Públicas (Central, Local e Regional) no mesmo período. O quadro 3, construído com base em dados também divulgados recentemente pela DGAEP do Ministério das Finanças, permite fazer a análise para 2016/2019.

Segundo a DGAEP do Ministério das Finanças, os aumentos efetivos de despesa verificados nas Administrações Públicas (Central, Local e Regional) no período 2016/2019, como consequência das progressões nas carreiras foi de 458 milhões € em 2018 e de 442 milhões € em 2019 (900M€ nos 2 anos), e não dos 465 milhões € e 666 milhões € (1131M€) como o governo refere no seu comunicado (quadro1). Admitindo que aqueles valores eram repartidos por todos os trabalhadores do Estado, o que não aconteceu, pois, muitos milhares de trabalhadores não tiveram quaisquer progressões nas suas carreiras, pois não tinham “10 pontos”, o aumento médio bruto seria de 1,4% em 2018 e de 2,1% em 2019, e não de 2,2% e 3,1% como refere o governo no seu comunicado. A falta de transparência é evidente e o propósito de virar a opinião publica contra os trabalhadores da Função Pública é claro.

A CONTRATAÇÃO DE 1000 TECNICOS SUPERIORES PELO MINISTÉRIO DAS FINANÇAS PARA O ESTADO, OU A FORMA COMO CENTENO ENGANA E DESTRÓI OS SERVIÇOS PÚBLICOS, INCLUINDO A ADSE

Na ADSE há mais de 600.000 documentos recebidos dos beneficiários que utilizam o Regime livre por tratar, o que unido à falta de pessoal, determina enormes atrasos nos pagamentos aos beneficiários que utilizam este Regime, atrasos em muitos casos já superiores a 3 meses (recebo muitos e-mails de beneficiários a queixarem-se que entregaram documentos há 5 ou mais meses para serem reembolsados cujos pagamentos continua por se fazer). A ADSE necessita de mais 70 trabalhadores (técnicos superiores e assistentes técnicos) para poder funcionar normalmente, ou seja, para eliminar os enormes atrasos que existem nos pagamentos aos beneficiários, para controlar a despesa e combater eficazmente a fraude e o consumo desnecessário muitas vezes promovido pelos prestadores.

Desde 2018 que sabe-se desta necessidade, mas as representantes do governo no Conselho Diretivo, que decidiram ficar com o pelouro de pessoal, retirando-me, nada fizeram durante muitos meses para resolver este problema. Só foi depois da denuncia pública divulgada pelos media de elevados atrasos nos pagamentos aos beneficiários que, em Março de 2019, e após o próprio Secretário Adjunto da Saúde ser confrontado com essa questão e ter respondido que não tinha recebido qualquer pedido da ADSE, é que as representantes do governo na ADSE começaram a preparar o pedido. Mas em 30 de Abril de 2019, por decisão do ministro Centeno é centralizado no Ministério das Finanças (na Direção Geral da Qualificação dos Trabalhadores em Funções Públicas, antigo INA) os concursos de Técnicos Superiores.

E esta Direção (ex-INA) lançou um “procedimento de recrutamento centralizado” para 1000 Técnicos Superiores (Portaria 125-A/2019) Concorrem cerca de 20.000 candidatos segundo os media. Mas o concurso está paralisado porque a Direção Geral de Qualificação dos Trabalhadores em Funções Públicas não tem meios para fazer a avaliação dos candidatos que se inscreveram, e Centeno não atribui um orçamento para que esta Direção possa adquirir externamente meios. E corre-se o risco que no Orçamento do Estado para 2020 não lhe seja atribuído o orçamento que precisa para poder finalizar o concurso, e os serviços públicos, entre os quais a ADSE continuarão a não ter os técnicos que precisam (só a ADSE, são mais de 20). É utilizando também estes processos que Centeno consegue eliminar o défice orçamental, mas estrangula e destrói os serviços públicos. No entanto, assim garante a sua carreira internacional.

Idêntica situação se verifica em relação aos Assistentes Técnicos (mais de 40) que a ADSE precisa. O concurso externo para a contratação destes trabalhadores é da responsabilidade da ADSE. Mas a ADSE, tal como sucede com ex-INA, não tem recursos humanos para o fazer. E para poder contratar externamente precisa de autorização de Centeno.

Com o atraso na aprovação do Orçamento do Estado para fevereiro de 2020, o orçamento da ADSE para 2020 só poderá ser utilizado provavelmente em março de 2020. E até esse mês a ADSE estará impossibilitada de fazer contratos de aquisições de serviços mesmo para “compra de horas a empresas de trabalho temporário” para colmatar a falta de trabalhadores.

Portanto é de prever que os atrasos nos pagamentos aos beneficiários se agravem ainda mais. É o alerta que queremos deixar e responsabilizar o governo.

Eugénio Rosa – Este endereço de email está protegido contra piratas. Necessita ativar o JavaScript para o visualizar. -14-12-2019

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